Friday, June 19, 2009

A estrada da servidão

Em animados debates universitários, ouço constantemente dizer que os liberais têm fobias ridículas de serem controlados pelo estado como se fossem autómatos. “ O estado não controla o indivíduo como se este fosse uma marioneta. “ dizem-me da esquerda.

Tenho de concordar. De facto, não é possível controlar alguém por efeitos mágicos nem sequer por cordéis imaginários; porém, é possível fazer algo diferente:

Imaginemos uma estrada com pessoas. Estas vão percorrer a estrada em busca dos seus objectivos de vida. Felizmente, como qualquer estrada, esta não era de via única, tinha várias saídas que levavam a outros destinos. Porém, uma entidade superior (o estado) proíbe que as pessoas possam enveredar por essas mesmas saídas porque acha que o melhor caminho para as pessoas é a via principal. Essa saídas são então vedadas. Perante esta proibição, sabendo que não querem andar para trás, terão de andar para a frente, pela via principal que, apesar de não se saber onde vai dar, é o único caminho permitido. Começam a longa e unidireccional caminhada, caminham morosamente até que, saturados da falta de opções e do caminho para a escravidão, começam a tentar sair da estrada, improvisando saídas e destruindo os rails de separação. Num ápice, estão já na relva que rodeia a estrada. Gera-se o caos, as forças da entidade superior (o estado) entram em acção para fazer com que os dissidentes voltem para a estrada onde estavam. As forças da entidade superior (o estado) estão mais bem armadas e conseguem fazer com que os dissidentes voltem para a estrada principal; contudo, alguns conseguiram fugir, correndo pela relva em direcção ao vazio na esperança de encontrar outra estrada controlada por outra entidade superior (outro estado). Para os que não conseguiram fugir, a caminhada continua.

Não existem cordéis imaginários, não existem controlos remotos, não existem formas de manipular o ser humano em absoluto, mas como via exequível, existem meios muito eficazes de cortar a possibilidades de escolha.

Inicialmente publicado no "O Replicador"

Wednesday, June 10, 2009

França: Educação Facilitista e o Mimetismo Português

Há umas semanas, critiquei a decisão do governo socialista de tornar o 12º ano obrigatório. Como consequência, recebi inúmeras respostas antagónicas de alguém que acha que tal medida, apesar da assunção da sua artificialidade, é benéfica para a sociedade, apresentando a França como o paradigma de um país extremamente produtivo apesar de ter uma educação artificial.

Constitucionalmente falando, a França é um país socialista. Portugal também. Não só a constituição portuguesa de 1976 foi baseada na constituição francesa, como a estruturação política é semelhante. O nosso amor pela autoridade e pelo centralismo estatal assim quis que se escolhesse o modelo francês em vez de um modelo mais liberal britânico. Consequentemente, somos uma sucursal francesa com pouca ambição geoestratégica, ao contrário de França.

A França adoptou já o 12º ano obrigatório, como seria de esperar. O delator dos meus argumentos advoga que a França é, com a ajuda de tão eficaz medida, um dos países mais produtivos dos mundo, onde os trabalhadores mais produzem por hora de trabalho. Aceitando a premissa como verdadeira, posso desde já dizer que tal resultado não se deve à educação, mas sim à engenharia governamental: com a instituição de salários mínimos e da rigidez laboral, as empresas francesas fazem com que as empresas fiquem apenas com os elementos produtivos, não contratando facilmente e assim deixando os elementos menos produtivos no desemprego.

Como tal, não é de surpreender que Paul Krugman, economista keynesiano, venha apresentar dados da OCDE que mostram que a produção por hora de cada trabalhador em França é ligeiramente maior do que nos EUA. Torna-se lógico, quando só se empregam os elementos mais produtivo, é natural que a média de produção por trabalhador seja maior. Porém, tal gera mais desemprego: em França, tal como na Europa em geral, não só há mais desemprego do que nos EUA desde dos anos 80 (reformas liberais Reagan), como o tipo de desemprego é de longo prazo, ao contrário dos EUA que apresenta, essencialmente, desemprego de curto prazo. Isto leva a que o crescimento do PIB potencial seja diminuto pois, segundo a lei de Okun, uma economia com desemprego elevado está a desperdiçar recursos, desviando-se assim da sua optimização. Adicionalmente, como resultado, teremos os custos de segurança social que o desemprego de longo prazo gera, suportados inevitavelmente por todos os que trabalham, diminuindo o poder de compra da sociedade por comparação com o poder de compra passível de ser atingido.

Mas é então a sociedade Francesa competitiva quando consideramos o resultado final observado?

A resposta é um claro não. Segundo o
World Competitiveness scoreboard de 2009 a França surge em 28º lugar no ranking dos países mais competitivos considerados, atrás de países como a Malásia ou o Quatar. Com todo o potencial que a França apresenta, esta não consegue ser competitiva como um todo, ficando inclusive muito atrás da sua vizinha Alemanha (13º lugar).
Mas será que há, pelo menos, liberdade económica em França, como seria de esperar de um país ocidental que é produto de uma democracia liberal?
Mais uma vez a resposta é não. Desta vez com um resultado ainda pior que Portugal: segundo o
Index de Liberdade Económicade 2009, a França é apenas o 64º país economicamente mais livre do mundo. O incentivo ao empreendedorismo e à inovação tem um carácter diminuto na pátria de Sartre.

Dizem-me então que não há problema porque a França oferece “qualidade de vida”: o sistema de saúde é um dos melhores, os serviços públicos também, etc...
Será discutível afirmar estes factos dessa forma categórica. De qualquer forma, essa é a parte alegórica da questão, mas esconde a factura que tem de ser pagar. Não devia ser surpresa para ninguém, mas essa equidade não é de facto equitativa (passe o pleonasmo): os impostos são dos mais altos da EU; a burocracia francesa é kafkiana; a liberdade de escolha do indivíduo é diminuta quando opta por seguir um rumo não burocrático; paga impostos para benefícios de outrem sem nunca saber a quem o dinheiro está realmente a ser entregue; o parasitismo da segurança social é elevado e inclusivamente produz uma cidade de Paris com uma das mais altas taxas de criminalidade da Europa; o estado consome e gasta 54% da produção de riqueza anual (cada francês, num ano, entrega mais de metade do que se ganha ao estado); o estado é enorme e intervém como actor em múltiplos negócios da sociedade civil diminuindo o incentivo ao investimento; as leis laborais são rígidas e não permitem a fácil troca e procura flexível de melhores empregos (Portugal é ainda pior); o estado francês quase não consegue atrair investimento estrangeiro devido a uma variedade de regulações e restrições, assim como aos impostos altos.

O proteccionismo económico e cultural francês é assim uma realidade. O investimento estrangeiro está inclusivamente interdito ao campo do áudio-visual. Como consequência, vamos constatando que a importância da língua francesa vai progressivamente tornando-se mais diminuta, mantendo-se apenas com alguma importância institucional no âmbito da EU, mas até isso mudará quando se tornar institucionalmente evidente que a língua que a Europa fala é a língua internacional em que o Inglês se tornou.

Culturalmente, poucas coisas de qualidade vêm da actual França, a literatura já não produz o que produziu, a música idem, o cinema, apesar de forte internamente devido a fortes subsídios, continua a gerar poucos filmes exportáveis que sejam consumidos pelo grande público, e, finalmente, as universidades franceses não constam na generalidade dos rankings das melhores e mais produtivas universidades mundiais. Tudo isto é sintomático da sociedade em que a França se tornou, uma sociedade onde o mérito é relegado para segundo plano no âmbito das decisões políticas.

Robert Nozick, filósofo americano, escreveu que pagar impostos para além do necessário para a vida em sociedade é uma nova forma de escravatura, pois tal consiste em fazer alguém trabalhar gratuitamente para os benefícios de outrem. É isto que o estado em causa faz, força determinados indivíduos a trabalharem para poder entregar, através da legitimidade estadual, o dinheiro destes a outros indivíduos. Ou como diria Max Weber, usando o monopólio da violência legítima.

O estado francês obriga todas as pessoas a ficarem na escola até ao 12º ano. Os socialistas portugueses querem seguir-lhes o rasto. No fundo, é pouco relevante para os socialistas se os cidadãos estão bem ou mal formados, porque eles não tencionam entregar qualquer poder à sociedade civil. Esperam controlar a sociedade de cima, e para isso não precisam de uma população muito bem formada, pois esta não terá realmente liberdade para tomar grandes decisões por si só.

França tem, com certeza os seus encantos. Este texto é uma resposta a quem usou as maravilhas francesas para justificar o facilitismo escolar. A pátria de Voltaire ou de Napoleão pode não ser, neste momento, o melhor sítio para formar os jovens; não obstante, é um excelente sítio para enveredar por uma vida especializada na caça ao subsídio, actividade que deve fazer parte da matéria artificial que é dada nas escolas francesas até ao, igualmente artificial, 12º ano.

Inicialmente publicado no "O Replicador"

Wednesday, June 03, 2009

Apaixonados Pelo Estado

Milton Friedman, economista Americano, critica o keynesianismo alegando que as suas práticas levam à estagflação (desemprego alto e inflação alta). Esta combinação improvável é o resultado da intervenção governamental que visa controlar os períodos de depressão económica. Por conseguinte, o fenómeno da estagflação pode ser uma realidade na Europa, onde o keynesianismo é a norma.

Friedman advoga que este fenómeno acontece porque os agentes económicos conseguem prever a acção governamental: depois de perceberem qual a acção sistemática do governo, os agentes económicos vão-se comportar como se já soubessem a próxima medida do governo (investimento público, injecções de capital, etc), neutralizando assim os efeitos dessas medidas, o que leva à famigerada estagflação.

Ocorre-me uma analogia com as relações amorosas: se um homem é enganado sistematicamente por uma mulher (ou vice versa), ele irá conseguir prever que da próxima vez também será enganado. Como consequência, o melhor que ele tem a fazer é deixar essa mulher. No entanto, se ele estiver muito apaixonado por ela, é capaz de se sujeitar à possibilidade, mais do que certa, de ser de novo enganado.

Esta é a imagem da Europa. Está apaixonada pelo Estado.

Inicialmente publicado no "O Replicador"
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